Curso "(Neo)liberalismo - o nome e a coisa"

Porque o futuro passa por destruir o nome e a coisa do presente

25 Maio 2023 |

Perto de duas centenas de pessoas reuniram-se na Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra para participarem no curso "(Neo)liberalismo - o nome e a coisa". Um curso de quem resiste, um curso de quem não se rende, um curso de quem sabe que um outro futuro é possível. Por Rodrigo Sousa.

As sessões do curso "(Neo)liberalismo - o nome e a coisa", organizado pelo Abril é Agora em parceria com a Associação Portuguesa de Economia Política e o Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, retrataram diversos setores de análises, desde a perspetiva histórica do liberalismo ao neoliberalismo, o neoliberalismo em Portugal, a sua relação com o sistema financeiro, o seu impacto na desregulação do trabalho e até o seu impacto na própria União Europeia, retratando o desafio imenso que é conceptualizar o neoliberalismo que, num nome só, carrega tanta coisa: tanto um projeto ideológico como um projeto político, um projeto económico, mas sobretudo um projeto social que nos tenta limitar as expectativas de futuro e aquilo que pretendemos almejar enquanto sociedade, ditando regras pelas quais nunca pedimos.

Se a conjuntura política atual, onde novas crises financeiras ameaçam abalar o capitalismo neoliberal e em que os efeitos da inflação ou da corrida belicista ao armamento agravam as desigualdades, com transferências de rendimentos do trabalho para o capital, tornam urgente a reflexão perante o sistema económico que nos rodeia, a verdade é que refletirmos a que futuro esta organização sócio-económica nos levará é também importante para percebermos como apenas conquistaremos um futuro digno através do fim desta mesma.

Numa altura onde um consentimento ideológico imposto venceu grandes camadas sociais e onde uma nébula se instalou no que toca ao que podemos perspetivar sobre o nosso futuro comum, percebermos o papel do neoliberalismo nessa construção de "não-alternativas" e como o podemos desconstruir será o primeiro passo para libertarmos as amarras que nos convencem que apenas podemos esperar um mercado de trabalho desregulado, uma sociedade que se rege pelas leis mágicas do mercado, onde as desigualdades crescem diariamente, onde quem trabalha não vê frutos do seu trabalho, onde somos colocados uns contra os outros e onde nos tentam vender de que se não chegamos ao topo da nossa carreira é por falta de esforço.

É o primeiro passo para resgatar a beleza da democracia e do nosso diálogo comum sobre o que queremos que seja a nossa sociedade, quebrando com o desencantamento da política através da economia, como tão bem definiu Will Davies, o neoliberalismo. Não aceitamos democracias limitadas por constituições materiais que só permitem escolhas entre técnicas muito próximas para cumprir um mesmo programa, pelo contrário, contra a hegemonia instalada, afirmamos que outro mundo é possível. Um mundo mais justo, fraterno e solidário.

Sabemos que são passos difíceis. Não só é difícil perspectivar um pós-neoliberalismo, com todos os contornos ou nomes que este futuro possa vir a ter, sendo mais fácil até imaginar o fim do mundo do que deste mesmo sistema económico, como a própria resistência por parte do status quo é muita - basta aliás vermos a bufonaria perante este curso para percebermos que o caminho está longe de ser fácil e de que há ainda muitas vozes que, perante a ousadia de sonhar os impossíveis, respondem com ódio.

No entanto, aos que nos pretendem limitar o sonho de um futuro completamente diferente do sistema desigual onde vivemos e a quem nos tenta afrontar, a melhor resposta que podemos dar é a resistência. E este curso foi um exemplo disso mesmo. Um curso de quem resiste, um curso de quem não se rende, um curso de quem sabe que um outro futuro é possível. Pelo direito ao sonho, contra as não alternativas, quebrando as raízes para que o que hoje conhecemos como realidade passe a ser uma memória enterrada no passado, de modo a que algo novo nasça.