Arraial dos Cravos

Foto de Mariana Carneiro.

Abril é a “rutura histórica que faz presente e faz futuro”

25 Abril 2023 |

Largo do Carmo tornou-se pequeno para acolher a enchente de pessoas que quiseram comemorar a Revolução no Arraial dos Cravos. Fernando Rosas e Guadalupe Portelinha lembraram os desafios com que nos defrontamos e a necessidade de encarar Abril como um instrumento do futuro.

Vinte e quatro associações de caráter cívico e cultural e mais de uma dezena de artistas responderam ao desafio da Associação Abril e da CULTRA e estiveram presentes no Arraial dos Cravos para comemorar Abril. O Largo do Carmo encheu por completo. Entre as 17h e as 24 horas, houve espaço para música, dança, humor.

Pelo palco passaram artistas como Lucas Augusto da Silva, Pedro Branco, Vitor Sarmento e Francisco Naia, Dueto Maiseu, Duarte Coxo, Francisco Fanhais, Couple Coffee, Batucadeiras da Boba, Jovem Conservador de Direita, Fio à Meada, e Tropicaústica. E, apesar do afluxo massivo de gente, foi possível abrir espaço bem no meio do Largo do Carmo para uma aula de dança e para a atuação do coletivo Colombina Clandestina.

Nas bancas asseguradas por inúmeras associações foi possível conhecer o trabalho destes coletivos, partilhar experiências, trilhar caminhos para defender a aprofundar Abril. No Arraial dos Cravos não poderiam deixar de estar presentes a luta pela habitação, pelo ambiente, pelos direitos dos animais, pela vida independente, a luta antirracista e a luta feminista, a luta dxs trabalhadorxs do sexo, a luta contra a precariedade e pelo direito aos cuidados. Não deixando de evocar todos os desafios com que nos confrontamos, e a necessidade premente de preservar e defender Abril, o ambiente foi de festa. O Largo do Carmo encheu-se de pessoas, de música, de sabores do mundo, de artesanato e de muita cor.

À meia-noite, punhos e cravos erguidos. Não faltaram vozes para cantar “Grândola, Vila Morena”, de José (Zeca) Afonso.

Há que trabalhar a ‘cultura do desassossego’”

A apresentação da iniciativa coube a Fernando Rosas, em representação da Cultra, e a Guadalupe Portelinha, presidente da associação Abril.

Guadalupe Portelinha sublinhou que, “passados 49 anos, verifica-se amargamente que, apesar dos avanços, ainda falta muita qualidade à nossa democracia”.

“Falta justiça social, o fosso continua a crescer em vez de diminuir, falta respeito pela alteridade do outro, dar espaço à autonomia e dignidade das pessoas. Os direitos básicos e sociais estão ameaçados, a Paz, o Pão, a Saúde, Habitação, de que nos fala Sérgio Godinho, continuam a faltar para todos, impera a corrupção quase legalizada, a irresponsabilidade dos dirigentes, a perversão dos valores, o fascismo a mostrar-se sob múltiplos rostos”, alertou a presidente da associação Abril.

Guadalupe Portelinha deixou um repto: “Há que trabalhar a ‘cultura do desassossego’. Questionar a realidade e confrontar a apatia e a inércia”.

É preciso olhar para Abril como uma arma de hoje”

Também Fernando Rosas fez a sua intervenção focado no presente e no futuro: “celebrar Abril não é uma nostalgia, não é uma coisa de antigos combatentes, não é uma coisa voltada para o passado, não é um suspiro”, destacou.

“Num momento em que a Europa está em guerra, em que o povo português sofre os problemas que sofre com a Habitação, com a Saúde, a Segurança Social, a Educação e a luta dos professores nas escolas, num momento tão sério como este, em que uma extrema direita emergente tenta cavalgar e manipular o descontentamento, é preciso olhar para Abril como uma arma de hoje”, afirmou o historiador.

Fernando Rosas acrescentou ainda que devemos encarar Abril “como um instrumento do futuro. Como algo de que precisamos. Como aquela rutura histórica que faz presente e faz futuro”.

“É esse o espírito de Abril”, rematou.